sexta-feira, 19 de março de 2010

Polaróides urbanas

“... Eu vi o lado radical do amor. Eu vi algolagnia, sexo e dor. Os dois lutando, ela descendo a escada do inferno. Ele, ereção, voltagem. Ela, taquicardia, descargas de adrenalina...”

Esse trecho do primeiro livro da autora Patrícia Melo “Acqua Toffana”, lançado em 1994, dá um dimensão da voltagem quase psíquica que a história alcança em suas quase 140 páginas.
Acabei de ler recentemente o livro (o segundo dela que leio) e posso afirmar que é um dos melhores “primeiros livros” (já que foi sua estréia em romances literários) que já li. É impressionante a habilidade de Patrícia em destrinchar a paranóia contemporânea dos seres. Ela sempre admitiu a fortíssima influência do autor Rubem Fonseca em sua obra, e isso é bem notório, principalmente pela forma seca e sintética com que narra os acontecimentos. O livro se divide em duas histórias que incidem sobre o mesmo viés de brutalidade, sob um olhar íntimo e condescendente com o inter-locutor. Patrícia trata dos extremos com uma dinâmica impressionante para uma iniciante, e demonstra que seu nome iria mesmo fincar raízes na moderna literatura brasileira. O primeiro (e único) livro da autora que eu li foi o badalado “O matador”, que anos depois foi adaptado para o cinema por José Henrique Fonseca (por acaso, filho de Rubem Fonseca e marido da atriz Cláudia Abreu) como “O homem do ano”. Confesso que não gostei muito nem do livro, nem do filme. Talvez por reconhecer demais a inferência de Fonseca na trama, considerei o livro como mais do mesmo. Agora, após ler esse desconcertante “Acqua Toffana”, reconsiderei os méritos de Patrícia e vi que seu talento independe de referências para ser justificado (ela já está em seu sétimo romance).
“Acqua Toffana” é um livro mais do que recomendável e indicado para àqueles que conjugam seu prazer literário com o vigor latente da prosa realista.
Obs: A imagem que ilustra esse post é de uma adaptação do livro para uma peça teatral homônima, em São Paulo, estrelado em 2007 pela atriz Dani Barros (foto).

Dica de Música: “O que sobrou do céu?” (Rappa)

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