O primeiro estágio saudosista de um indivíduo vem na casa dos vinte anos, quando imersos nas intempéries do início da vida adulta, lembramos da liberdade que a adolescência nos trazia. Foi essa a gostosa sensação que o filmaço “As melhores coisas do mundo” me passou ao fim de uma sessão no cinema. A diretora Laís Bondasky (que já havia acertado nos notáveis “Bicho de sete cabeças” e “Chega de saudade”) foi extremamente inteligente ao formatar o filme não como um retrato dos adolescentes de uma era, mas buscando radiografar o estado de espírito universal desta faixa de idade. Algo como o cineasta americano Gus Van Sant imprimiu na criticidade de seus filmes sobre a juventude de seu país. Com isso, Laís conseguiu com que seu longa obtenha a assimilação de qualquer público, de 8 a 80 anos. Com roteiro de Luiz Bolognesi, marido e parceiro constante da diretora, o filme é uma livre adaptação da série de livros “Mano” de Gilberto Dimenstein, que acompanha os alunos de uma escola secundária paulista de classe média e suas primeiras experiências com as desventuras que a idade lhes concede, como sexo, bebidas e afins. O “Mano” do título literário é o apelido de Hermano, sob o qual todo o filme é dimensionado. Vivido pelo estreante Francisco Miguez (nunca tendo feito nenhum trabalho de ator e escolhido durante uma pesquisa nas escolas de São Paulo), Mano torna- se a retina ampliada do filme, que conjuga com dignidade as diversidades de um meio, com certo intimismo, ao focar seu drama familiar. Procurando retratar mas não interferir, Laís entrega cenas memoráveis para endossar sua trama, como o abraço doloroso que Mano dá em seu irmão, num momento de desespero ou as cenas em que ele interage com sua mãe, vivida por Denise Fraga, com uma interpretação tocante. O elenco é uma das forças do filme, começando pelo próprio Miguez que, mesmo inexperiente, tem uma segurança cênica impressionante, muito pautado pelo instinto. Outra surpresa é o ator e cantor Fiuk, no difícil papel do irmão mais velho depressivo. Não vejo “Malhação” e não sabia que ele era bom. Assim como todo o elenco jovem da escola e até as participações de Paulo Vilhena e Caio Blat, vivendo personagens mais maduros, funcionam muito bem. O cinema brasileiro é carente de produções que dialogue com o público jovem. Se o primeiro grande passo, desta Retomada, foi dado por esse filme, a progressão será animadora. No final, o processo de maturidadeque um adolescente passa para endossar sua afirmação de que “não é tão impossível ser feliz depois que a gente cresce. Só é mais complicado” transcende a tela do cinema e reverbera em todo o estágio de evolução contínua de nós mesmos. Viramos o “Mano” aos 20, aos 30, aos 40 etc, etc...
Dica de Música: “Something” (Beatles)
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