quarta-feira, 29 de julho de 2009

Onde os fracos não têm vez


O cinema de autor tem lá suas idiossincrasias, mas possui grande força artística quando sua equação cinematográfica é justificada numa soma de talento e experiência. Assisti recentemente a dois filmaços de diretores que imprimem sua autoria nos projetos que conduzem: Ang Lee e Sidney Lumet.
Em seu filme mais polêmico, “Desejo e perigo”, Lee reafirma sua enorme capacidade de conduzir uma trama, com a placidez característica de seu DNA oriental. A história gira em torno de uma jovem que é infiltrada na casa de um chinês, colaborador dos japoneses, em plena ocupação na 2º guerra, como parte de um plano para matá-lo por traição a pátria. A tensão aqui é harmonizada com a contenção emotiva que o cineasta sempre procura em seus filmes (de “Banquete de casamento” a “Brokeback Mountain”). As comentadas cenas de sexo têm função simbólica frente à rigidez daquele universo. É um dos melhores filmes do diretor, principalmente por jogar luz à complexidade que se impõe entre uma relação de poder e submissão. Outro filme que merece a alcunha da autoria criativa é o maravilhoso “Antes que o diabo saiba que você está morto” de Lumet. O argumento por si só já é bem convidativo: um executivo viciado em drogas convence o irmão a roubar a joalheria dos pais. Porém, durante o assalto, eles acidentalmente matam a própria mãe. Lumet, diretor de grandes filmes do passado como “Serpico”, use seu filme para expressar sua visão desencantada do ser humano e como isso se ramifica dentro de um contexto familiar. É pelos esquecidos e fracassados que se compreende o ser humano. A tensão no filme é física e emocional, personificada a cada cena com um time de atores irretocáveis: ora pela dualidade intempestiva dos irmãos, vividos por Philip Seymour Hoffman (que ator extraordinário!) e Ethan Hawke, ora pela figura central do pai, onde Albert Finney entrega uma das cenas mais fortes do cinema, na conclusão final. Destaco ainda a sempre competente Marisa Tomei, dando nova dimensão ao vértice de um triângulo amoroso. A trama radiografa um abismo anunciado, onde as razões não são facilmente justificáveis. Sidney Lumet comprova que cinema é feito com verdade e precisão... e um pouco de desencanto, para revelar aquilo que nem o diabo sabe sobre nós mesmos.

Dica de Música: "Insensatez" (Diane Krall)

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