Estive na pré estréia promocional do filme “Divã” de José Alvarenga, estrelado pela atriz Lília Cabral. O filme vem sendo aguardado com grande expectativa pelo mercado, já que após o imenso sucesso de “Se eu fosse você 2”, que se tornou a maior bilheteria da retomada, desbancando “Dois filhos de Francisco”, poderá vir a ser mais um candidato a êxito em nosso sofrido cinema.“Divã” é baseado no livro homônimo de Martha Medeiros. Li esse livro há uns dois anos, uma vez que acompanho (com relativa regularidade) sua coluna dominical no Jornal O Globo. Martha é uma competente cronista da contemporaneidade sob o prisma feminino e, neste seu primeiro romance, ela desenvolveu um verdadeiro ensaio sobre o redescobrimento da vida pós – separação. A história acompanha Mercedes, que após um casamento de 20 anos, vive o revés do divórcio consensual e o bônus que essa liberdade pode oferecer.
Lília, que já havia dado vida a personagem na versão teatral do livro, confere um modelo todo próprio a sua Mercedes, fundamentando as nuances do livro e, auxiliada, por uma bem construída direção de atores. Alvarenga evolui bastante após o (tecnicamente) claustrofóbico “Os Normais, o filme”. E a opção pela comicidade na trama (que no livro é apenas complementar) funciona. Após a sessão, houve um bate-papo sobre o filme, com a autora do livro, a atriz e o diretor (a foto do post abaixo é minha). Eu perguntei ao diretor se, após ser acusado de manter a estética televisiva em seu filme anterior (“Os Normais, o filme, que ele dirigira em 2003), nesse novo filme e na continuação do próprio “Os Normais” (que estreia em agosto), essa máxima se manteria. Visivelmente irritado, ele respondeu que muito antes de ser diretor de TV (onde dirigiu a citada série e vai estrear em abril a nova série policial da Globo “Força Tarefa”) ele sempre trabalhou em cinema, portanto, tudo o que dirigiu e dirigirá seria por essa ótica original da sétima arte.
Particularmente, não acho que “Os Normais” seja propriamente televisivo, mas é inegável que, ao migrar para a telona, o projeto não abraçou completamente seu viés cinematográfico, caindo no erro de outras séries que viram filmes (daqui e dos Eua) que parecem mais um episódio longo, como ocorreu em “Sex and the city, the movie”. Assim como “Os Normais, o filme”, “Divã” é um filme simpático e que cativa verdadeiramente a platéia (e, em sua engenharia, melhor que o filme de Rui e Vani), mas o carisma dessas produções tem mais méritos por esconder suas próprias limitações. Assistam sem medo.
Dica de música: “September” (Earth, Wind & Fire)

É obvio que, ao propor a transição da hq para o cinema, qualquer diretor do planeta iria sofrer com muita celeuma. O próprio criador da série disse que a obra era “infilmável”. E, convenhamos que, quem lê a história, encontra dificuldades em vislumbrar essa adaptação. Mas, após tanta novela de bastidores, troca de diretores e afins, eis que Zack Snyder (diretor de um dos melhores filmes de terror já feitos “Madrugada dos mortos” e do estiloso “300”) enfim realiza a adaptação e com êxito. Snyder é um diretor que se destaca pelo forte enfoque na estética (ou seria estilismo?) em seus trabalhos. "Watchmen" é um ponto de equilíbrio nesse sentido. Mas ainda assim, é por esse viés que o filme entrega uma das aberturas mais brilhantes de todos os tempos, onde o diretor sintetiza o entendimento da história com apurada inteligência narrativa.

Enfim falarei sobre o Oscar, já que, como dissera num post passado, muitos dos filmes indicados não haviam sido lançados no país à época e, automaticamente, me impossibilitaria de fazer uma análise mais pungente sobre os indicados. Dos quantro indicados, só não pude assistir "Frost/Nixon" de Ron Haword, mas breve postarei sua "crítica" já que é um filme (por mim) muito aguardado - apesar de detestar o diretor.
Sempre considerei o Oscar como uma necessidade ao glamour que o cinema sempre exigiu. Que Godard e sua intelectualóide européia não me ouça, mas até no terreno deles isso se aplica, afinal o tradicional Festival de Cannes se valeu desse mesmo showbusiness para ter o respeito que tem. Dada as devidas proporções. Voltando ao Oscar, nesse ano a premiação buscou se reinventar devido ao fraco desempenho na tv americana em anos anteriores. Inclusive suprimiu até uma de suas marcas mais representativas, escalando para apresentar, não um comediante, mas um ator de musicais: o "Wolverine" Hugh Jackman. Jackman, que tem uma prolífera carreira no teatro australiano - onde nasceu - e faz sucesso também na Broadway, trouxe certa serenidade a apresentação. E ainda mostrou carisma nos musicais que permearam toda a noite.
E, confirmando as expectativas, o Oscar foi para "Quem quer ser milionário?" de Danny Boyle (na foto abaixo, com o protagonista do filme, Dev Patel) . Já falei aqui que esse filme é muito intrigante para mim mas, diferente do Oscar 2006, onde o bom (mas irregular) "Crash" surpreendentemente venceu o até então (e merecidamente) favorito "Brokeback Mountain" de Ang Lee, não foi de todo injusta a premiação ao filme. Eu, sinceramente, acho "Milk" de Gus Van Sant, mais sincero em seu discurso e em seu retrato emotivo à sua história. Dos quatro que vi, era o meu favorito. "O curioso caso de Benjamim Button" é belíssimo mas - mesmo tratanto-se de um filme de David Fincher - é um cinema mais clássico em sua forma, o que tira muito de sua força frente aos filmes citados. E "O leitor" nem deveria estar entre os cinco. Também concordo com a torcida por "Batman - O cavaleiro das Trevas", que redefiniu seu gênero e impôs um novo padrão de qualidade aos filmes baseados em Hqs. Ou até "Ensaio sobre a cegueira", este incompreendido filme de Fernando Meirelles.
Gostei bastente da premiação aos melhores atores e atrizes. Sean Penn ter ganho por "Milk" foi uma vitória da preciosista construção de personagem do ator. Mickey Rourke, por "O lutador", que abocanhou o Globo de Ouro, era uma ameaça mas, cá entre nós, apesar de sua entrega total ele interpretou a si mesmo. Brad Pitt ("Benjamim Button"), Frank Langella ("Frost/Nixon") e Richard Jenkins ("O Visitante") foram bons concorrentes e as indicações honraram seus talentos. Entre as atrizes o Oscar resolveu fazer justiça e premiou Kate Wislet por seu difícil papel em "O leitor", aliás ela é a melhor coisa do filme. Como não vi ainda "Dúvida", não sei se Meryl Streep faria frente a Kate. Tenho que admitir que sou sensível a Meryl. É uma atriz que difícilmente erra. Anne Hathaway, pelo pouco que vi, se reinventa em "O casamento de Rachel" e também seria um bom páreo. Angelina Jolie (por "A troca") e Melissa Leo (ressurgindo em "Rio Congelado") comprovam que 2009 foi um ano difícil para os votantes.
E entre os coadjuvantes, uma dúvida e uma barbada. Para atriz, Penelope Cruz era uma possibilidade incerta. Ganhou. Seu trabalho no filmaço "Vick Cristina Barcelona" de Woody Allen é irreprensível, principalmente por trafegar em cima do clichê regional. Eu estava dividido já que todas as indicadas eram boas. Quanto aos atores, Heath Ledger e seu (já antológico) Coringa, não tinham concorrentes. Não pelos outros indicados, mas pela força sem igual da interpretação do falecido ator. Foi também um meio de premiar o filme enquanto a Academia de Artes Cinematográficas não revê seus conceitos arcaicos de avaliação.
O filme se equilibra na linha tênue entre a fábula lírica e oportunismo discursivo. Como fábula é encantador. Ao narrar a ascenção de um garoto pobre que, dotado de uma inteligência incomum, está em vias de ganhar uma fortuna de 20 milhões de rúpias em um programa de tv, Boyle cria um verdadeiro espetáculo sócio-emocional sobre a superação e os caminhos para tal, com uma eficiência que poucos livros de auto-ajuda conseguem. Adornando com sacarose britânica sua trama, o diretor se vale de flashbacks para justificar que o êxito do protagonista é resultado de uma dramática história de vida, onde povoam vilões insanos e aventuras, a la Charles Dickens. Essa linha temporal da narrativa nos remete (claramente) ao neo-clássico "Cidade de Deus" de Fernando Meirelles, seja pela estilística fotografia, seja pela estrutura da trama em si.


Sean Penn brilha mais vez dando impressionante forma ao personagem (aliás não deixa de ser curioso ver o outrora homofóbico e machão ator com leves afetações em algumas cenas). Apesar do trabalho primoroso de Frank Langella em "Frost/Nixon" e da total entrega de Mickey Rourke no quase autobiográfico "O lutador", Penn merecia mesmo o segundo Oscar que rebeceu, principalmente pela bela composição que deu a seu Milk, desvencilhando com louvor dos perigos de sua forma cênica. Josh Brolin e James Franco também conseguem imprimir excelentes atuações com a ambiguidade (sã/sádica) do primeiro e a maturidade serena do segundo. Há ainda a solar presença de um irreconhecido Emile Hirsch e o "High School" Lucas Grabeel, mostrando que sua carreira caminha para a versatilidade.
