
Dica de Música: “Calada noite preta” (Vange Leonel)
"Não existe meio mais seguro para fugir do mundo do que a arte, e não há forma mais segura de se unir a ele do que a arte." Goethe não imortalizou essa máxima à toa. Sua teoria fundamenta a minha prática nesse blog que se propõe a discutir a arte em todas as suas vertentes: pois seja na cultura de massa, seja na linha da erudição, toda a forma de expressão artística vale a pena. O cinema que o diga...
O que é essa tal de Lady Gaga? Com certeza é o que muitos se perguntam diante da persona que essa cantora (!) incorporou no Showbusiness e parece ter vindo para ficar. Não sou lá muito fã de suas músicas (me parecem uma coisa meio Cher pós-moderna), mas não consigo ficar indiferente a sua mise-en-scéne. Seus clipes são loucamente geniais, seu "figurino" vem acompanhados de discursos... divertidíssimos, e suas apresentações (como a do "MTV Awards") colocam no chinelo muitos números cênicos do Oscar, Garmmys e afins. Diria que ela sabe muito bem se vender, a ponto de eu estar falando nela por aqui. Ela acaba de lançar o clipe de seu single "Telephone", que canta com ninguém menos que Beyonce. O hit é banaca (a produção da música usa os toques sonoros de um telefone), mas o clipe é o supra sumo do liquidificador pop que torna nossa vida mais divertida. Andy Warhol e Salvador Dalí devem estar se revirando no túmulo de satisfação. Prestem atenção no (divertido) trabalho de concepção (há várias referências ao cinema) e direção de arte do clipe. Obra-prima!
O excesso de paixão de um diretor por um projeto pode ser nocivo para seu resultado final. Martin Scorcese caiu nesse paradigma em dois de seus últimos filmes: “Gangues de New York” e “O aviador”. Almodóvar também, no recente “Los Abrazos rotos”. Como se pode ver, esse é um pecado dos grandes, e depois de acertar, tanto na trilogia “O senhor dos anéis”, quanto no remake de “King Kong”, o neozelandês Peter Jackson caiu nas armadilhas passionais de suas pretensões em seu novo e aguardadíssimo filme “Um olhar do paraíso”.
Baseado no romance da norte-americana Alice Sebold, “Uma vida interrompida”, publicada em 2002, o filme narra a história de Susie Salmon, que aos 14 anos foi estuprada, assassinada e estripada, mas não morreu completamente. Algo estranho aconteceu com ela. De onde está - não é o paraíso, mas também não é o inferno, e não parece ser o purgatório - ela pode observar sua família e seu assassino e torcer para que ele seja preso.
A trama em si é muito boa e, talvez seja o contraponto positivo frente às irregulares escolhas do diretor. Jackson tratou o tema com excessivo enfoque lisérgico o que fez com que todo peso da história seja enfraquecido. Mesmo sendo lindamente interpretada por Saoirse Ronan (que conquistou meu coração em “Desejo e reparação” e vem trilhando um caminho certo em Hollywood), aquele paralelismo que se dá entre o mundo real e o pós-morte não se justifica e nem ajuda no decorrer da história. Parece que Jackson ficou tão encantado com o livro que quis inflar toda sua transposição acabando por expor personagens sem contexto (uma “personagem emo” que tem ligação com os mortos), tramas totalmente desconexas (a participação de Susan Sarandon, a fuga da personagem de Rachel Weisz) e soluções constrangedoras (o desfecho do antagonista e o beijo final dos protagonistas). O longa não consegue impor um ritmo ou fluência narrativa, uma vez que se perde em desvios equivocados e que acabam distanciando o espectador da história.
Se o filme tem um ponto forte é seu elenco que, além da ótima Saoirse, tem as sempre brilhantes performances de Susan Sarandon (aqui fazendo o que pode num personagem perdido na trama) e Rachel Weizs (suas lágrimas são sempre verdadeiras). Mark Whalberg me surpreendeu pela sensibilidade com que expõe a perda de uma filha, assim como o bom trabalho de Rose McIver, irmã da Susie, que vira o grande esteio do filme em sua metade final. Mas é Stanley Tucci, que vive o psicopata assassino – indicado ao Oscar de ator coadjuvante – quem entrega o melhor desempenho, provando que sua versatilidade não tem limites, vide seus trabalhos em “O diabo veste Prada” e “Julie & Julia”. A construção que fez de sua personagem é para aplaudir de pé (e só nos faz lamentar a forma idiota que o roteiro encontrou para seu desfecho).
É difícil de entender como Peter Jackson conseguiu transpor um livro bem mais complexo e difícil como “O senhor dos anéis” para os cinemas e neste, relativamente mais “filmável”, tenha errado tanto. Ainda que o filme deixe transparecer a mão forte e criativa do cineasta, a sensação é que, entre a grandiloquencia e a pretensão, o filme acabou perdendo o seu sentido. Não foi dessa vez, Peter Jackson...
Dica de Música: "Um dia, um adeus" (Vanessa da Matta)
Eu sei que os meus poucos leitores estão esperando o meu post sobre o Oscar e seus vencedores... (já recebi uns 10 emails cobrando). Não me pronunciei ainda pois não assisti "Guerra ao terror", o tal ganhador do Oscar de melhor filme. O que farei ainda essa semana. Mas resolvi escrever só para salientar o filme "Direito de amar", tradução açucarada de "A single man", primeiro filme do estilista super balado Tom Ford. Também não assisti ainda (o filme fala de um professor inglês que luta para retomar a vida após a morte de seu parceiro, em um acidente automobilístico), mas prestem atenção ao trailer do filme. Que trailer lindo, e o mais impressionante é que nem parece que as imagens são de um filme de um diretor estreante.
Tom Ford, que havia redefinido a marca Gucci e agora investe pesado em sua marca própria de roupas masculinas (realmente seus ternos são interessantíssimos. E olha que eu nunca achei graça em ternos...), agora prova que sua competência estética casa bem com o audiovisual. "A single man" fez presença no Oscar, principalmente pela indicação do sisudo Colin Firth a melhor ator, que perdeu para Jeff Bridges (e muitos defendem ser uma premiação injusta). E esse meu entusiasmo é apenas com o trailer...
Dica de Música: "Eu sou sua sabiá" (Marisa Monte)
Por onde anda Sade? Era o que me perguntava durante muito tempo, já que o último cd de inéditas (“Sade Lover’s Rock”) foi lançado em 2000. Mas a resposta demorou, mas veio: Acaba de ser lançado seu mais novo cd “Soldier of Love”. E, pelo single de lançamento, vejo que a demora valeu a pena.
Sade é uma espécie de Marisa Monte da Inglaterra. Possui total controle sobre sua carreira e é extremamente radical quanto à preservação de sua privacidade. No texto de lançamento do cd, ela afirmou “Só faço disco quando sinto que tenho alguma coisa para dizer. Não estou interessada em lançar música só para vender. Sade não é uma grife”. Esse tal senso de produtividade é importantíssimo para a qualidade de seus trabalhos, mas do que provado nos CDs anteriores, além da performance ao vivo, que converge intuição, talento e inventividade.
Ainda não escutei o cd inteiro, mas deixo para vocês uma apresentação ao vivo no Letterman, da nova música que continua tão... Sade; ao mesmo tempo em que é notória a preocupação em absorver novas sonoridades. A sofisticação continua intacta, como sua obra-prima “No ordinary love”.
Dica de Música: “Soldier of Love” (Sade)