sexta-feira, 3 de abril de 2009

Oscar e progresso

Na próxima semana (dia 14 de abril) acontecerá a entrega do troféu Grande Otelo – o Oscar tupiniquim – no Grande Prêmio Vivo de Cinema, aos melhores filmes nacionais de 2008. Apesar de não amplamente divulgada, o Brasil possui (assim como Hollywood) uma Academia de Artes Cinematográficas, que respalda essa premiação. A meu ver, seria interessante para o evento (e sua consolidação) que fosse coberto pela Tv aberta, mas só será passado no Canal Brasil (Net).
Ao longo dos anos, diferentes patrocinadores foram alternando-se na nomenclatura da premiação, o que acabou por fazer com que a mesma não tenha uma identidade forte com o grande público. Nos últimos anos, essa operadora de telefonia tem se mantido constante no posto, o que parece ser fator decisivo para a regularidade da festa.
Os indicados a melhor filme são: “Ensaio sobre a cegueira” de Fernando Meirelles; “Linha de passe” de Walther Salles e Daniela Thomas; “Estômago” de Marcos Jorge; “Meu nome não é Jhonny” de Mauro Lima e “O banheiro do Papa” de César Charlone e Henrique Fernandez.
“Ensaio sobre a cegueira”, para mim, é o mais ousado de todos, em termos tanto artísticos, quanto técnicos (com o conhecido apuro estético de Meirelles). Por isso, é o melhor dos cinco. Claro que, por não ser um filme com DNA 100% brasileiro, dada a sua subvenção financeira partir de países como Japão e Canadá, possa perder um pouco na avaliação final. É um filme lamentavelmente incompreendido, pois a opção do cineasta em evocar a metáfora de José Saramago de forma estéril e desglamourizada,não foi digerida facilmente tanto pelo público (americano, onde o filme foi fracassado, ao contrário daqui, onde cravou mais de 1 milhão de espectadores) e crítica.

“Linha de passe”, é mais um excelente laboratório social da dupla Walther Salles e Daniela Thomas. Mais complexo que a obra maior de Salles (“Central do Brasil”) e mais bem acabado que a última contribuição dos dois (“Terra estrangeira”), esse filme mostra o quanto essa parceria evolui na radiografia de um Brasil imerso em suas próprias contradições sociais. Um belo filme, com chances reais de sair premiado.

“Estômago” se destaca como um dos roteiros mais interessantes do cinema brasileiro. Marcos Jorge demonstra destreza ao sublinhar a construção do poder num indivíduo, com humor negro e, paradoxalmente, sofisticado.

“Meu nome não é Johnny” é o elo mais pop dos cinco indicados. O diretor Mauro Lima fez um filme correto, mas com uma energia impressionante. Acho que Selton Mello se repete um pouco dando vida ao personagem, mas, ao alinhar o desfecho de seu filme, Lima mostra que não existe gratuidade na adrenalina de seu cinema.

“O banheiro do Papa”, outra co-produção brasileira, só que com países da América Latina e França, eu não vi inteiro, mas a improvável história de um homem que constrói um banheiro para o possível grande número de fiéis que compareceriam a visita do Papa a uma pequena cidade que faz fronteira entre o Brasil e o Uruguai, é bem simpática, com cara de sessão da Tarde de luxo.

Dos indicados a melhor ator: João Miguel (“Estomago); Seltom Mello (“Meu nome não é Jhonny”); César Trancoso (“O banheiro do Papa”); Ary Fontoura (“Guerra dos Rocha”); Stepan Nercecian (“Chega de saudade”) e Wagner Moura (“Romance”); torço para o domínio cênico de João em “Estômago”. O ator consegue imprimir credibilidade à mudança que seu personagem sofre do início para o fim do filme. Nercecian e Wagner, também estão muito bem em seus papéis.
Para melhor atriz – Cássia Kiss (“Chega de saudade”); Cláudia Abreu (“Os desafinados”); Darlene Glória (“Feliz Natal”); Leandra Leal (“Nome próprio”) e Sandra Corveloni (“Linha de Passe”) – fico dividido entre as três últimas. Leandra é a entrega em pessoa no irregular filme de Murilo Salles. Sandra, dentro de seu comedimento, torna-se a alma de “Linha de passe” e Darlene Glória injeta substancialidade à família desestruturada do (primeiro) filme dirigido por Seltom Mello. Talvez ela mereça o Grande Otelo por se manter tão viva em cena, mesmo há anos longe da carreira.
Dentre os demais indicados, destaco o mesmo duelo para filme, na direção, entre Meirelles e Walther Salles/ Daniela Thomas; para ator coadjuvante, a briga parece feia entre Babu Santana (perfeito com o bandido de "Estômago"), Lúcio Mauro (“Feliz Natal”), Gael Garcia Bernal (iconoclasta em “Ensaio sobre a cegueira”) e o surpreendente Paulo Miklos (também por "Estômago"). Já atriz, deve ficar entre o charme de Alice Braga no filme de Meirelles e a versatilidade de Andréa Beltrão em "Romance".
Vale conferir essa competição, que nada mais é que um grande estímulo ao nosso cinema. Só espero que, ano que vem, não tenhamos um patrocinador com um sub-título de "dedicação total a você!"
Dica de música: "Sá marina" (Wilson Simonal)









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