terça-feira, 25 de novembro de 2008

Como nossos filhos...






Estão nos cinemas dois filmes que representam, em eixos inversamentes opostos, uma parcela da juventude daqui e dos Eua de formas bem emblemáticas. Assisti à eles: os bons "High School Music 3" de Kenny Ortega e "Última parada: 174" do inconstante Bruno Barreto. Falar sobre os dois filmes pode soar estranho mas, como os assisti num curto espaço de tempo, quase no mesmo dia (e suas estréias brazucas foram no mesmo dia), fiquei refletindo sobre as discrepâncias que se estabelecem no retrato desses dois universos.





Na poderosa franquia da Disney, eficientemente dirigida por Ortega (pelo menos naquilo que ele se propõe), vemos que, em tempos de Obama, um esforço lascivo de se imperar o politicamente correto, vertende da qual a empresa já vem trabalhando desde o início da cinessérie televisiva. Uma protagonista hispânica, uma gordinha como uma das melhores bailarinas do grupo, enfim, são muito os discursos que permeiam todo o filme afim de se inserir a idéia (democrata?!) de multiplicidade ao mundo (inclusive para os mais perceptivos, há até uma indefinida inserção de um personagem levemente homossexual (republicano?!) no grupo). Santa Disney!!! Mas o contraste que se abateu sobre mim não fora esse; mas sim o choque que se estabelece entre àquela realidade e a nossa, principalmente assistindo ao filme "Última para:174". Enquanto Troy e cia empregam seus dilemas nas inconstâncias de suas decisões futuras, nos extremos entre o prazer e carreira profissional, a nossa nem tem a oportunidade de ter, mas sim apenas de ser o grande dilema que nada mais é que uma grande herança da sociedade partida (grande Zuenir) a que fazemos parte.


Como cinema, "High School Music 3" endossa a bandeira de sua empresa e tece um mundo perfeito em meio à puberdades dançantes. Chego à conclusão que essa apatia não é um defeito. O filme, como um todo, lembra-me àqueles grandes musicais do século passado, onde Gene Kelly e Fred Aitaire desfilavam graça e talento com coreografias reluzentes. A simplicidade do roteiro dá luz a sua verve musical transformando HSM3 num grande espetáculo. Insípido mas encantador. Já o filme de Bruno Barreto, representa um salto e tanto em sua carreira. Se bem que sua trajetória é marcada por lapsos de genialidade bem remotos, afinal a distância que demarca seus filmes mais relevantes é medida pelo tempo entre o ótimo "Além da paixão" de 1984 e o impactante "O que é isso companheiro ?" de 1997. Nesse filme, que remonta a trágica história do assalto ao ônibus 174, no bairro do Jardim Botânico em 2000, Bruno se mostra em estado de glória com uma direção precisa, pautada num roteiro bem interessante. Mas, se como cinema a produção é um acerto (mesmo que tenha diminuído seu clímax, tornando o assalto em si quase irrelevante na história, o que é um erro imperdoável), como discurso é altamente questionável. Vitimizar a figura do Sandro (sequestrador) para justificar um cenário social foi um caminho um tanto equivocado. Vítima por vítima tínhamos a maior de todas ali que foi a Geíza (praticamente figurante no filma), morta (grávida) como refém do sequestrador em meios às trapalhadas da polícia. Ela sim merecia um filme de sua saga, pois veio do nordeste para tentar uma vida melhor no Rio e teve seus projetos ceifados por um inconsequente, na volta para sua casa. Não tenho dúvidas - e o excelente documentário "174" de José Padilha corrobora essa compreensão - de que parte de nossa sociedade muito das mazelas sociais que temos vivido. Mas vítimas somos todos e nos transformamos em heróis (nem que para nossas próprias consciências) quando procuramos reverter aquilo que nos é estabelecido. Até porque para cada Sandro, existem várias Geísas por aí, só que finais bem mais felizes.

Dica de Música: "Viva La Vida" (Coldplay)







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